"Rogue
One" e uma ressurreição polémica: Estará Hollywood a ir longe demais?
A opção
artística do realizador Gareth Edwards para "Rogue One: Uma História de
Star Wars" é um ponto de viragem em Hollywood e levanta a questão ética
sobre até onde se está disposto a ir com o uso da tecnologia. ARTIGO COM
SPOILERS do filme "Rogue One: Uma História de Star Wars".
Muitos dizem
que é um dos momentos mais altos do filme. Alguns defendem mesmo que é a melhor
interpretação entre todos os atores. E, no entanto, existe um pequeno senão...
"Rogue
One: Uma História de Star Wars" estreou nas salas há vários dias. É muito
provável que os fãs mais ardentes já o tenham visto até mais do que uma vez —
em Portugal foram mais de 110 mil na primeira semana, mas este ainda é o momento
para dizer que este artigo tem spoilers.
É provável
que já saiba do que se trata pois está a suscitar um debate sobre os limites e
a ética (ou falta dela) de Hollywood: a aparição digital de Peter Cushing como
Grand Moff Tarkin. A
notícia da sua "participação" surgiu no verão de 2015 e foi encarada
por quase todos como mais um rumor à volta da saga. Mesmo quem a levou a sério
pensou que se trataria de uma aparição simbólica, um pouco como aconteceu no
final de "A Vingança dos Sith", quando uma versão mais jovem aparecia
ao lado do Imperador Palpatine e de Darth Vader a fiscalizar a construção da
primeira Estrela da Morte.
O que
acontece em "Rogue One" é diferente: Tarkin é uma personagem integral
da história e o venerável britânico falecido em 1994 foi ressuscitado para dar
uma nova interpretação do vilão. Ultrapassa o trabalho da Weta Digital, a
empresa de efeitos especiais fundada por Peter Jackson, para criar uma
personagem digital que permitisse completar as cenas de Paul Walker em
"Velocidade Furiosa 6", em 2015.
A Disney só
vai revelar pormenores do processo em janeiro, quando tiver passado tempo
suficiente para quase todos os interessados assistirem ao filme, mas sabe-se
que o ator Guy Henry, que tem uma vaga semelhança com Cushing, foi escolhido
para fazer os gestos e dizer as frases de Tarkin e a partir disto, a tecnologia
informática da Industrial Light & Magic conseguiu criar depois uma réplica
quase perfeita, com olhos expressivos e onde quase desaparece o brilho
artificial semelhante à pele de cera.
A maior
dificuldade acabou por ser outra: como Peter Cushing achou as botas militares
da sua personagem muito desconfortáveis, George Lucas deixou-o trabalhar de
pantufas e não existe nenhuma cena de "Star Wars" a mostrar a parte
inferior dos membros. Os técnicos tiveram de pesquisar muitas horas de filmes
antigos do ator para conseguir recriar de forma realista os seus movimentos.A
atriz norueguesa Ingvild Deila também serviu de modelo para a imagem da
Princesa Leia Organa
Curiosamente,
perto do fim de "Rogue One" existe um momento, muito mais breve e
menos convincente, em que a Princesa Leia de Carrie Fisher surge tal como a vimos
pela primeira vez em 1977- a atriz norueguesa Ingvild Deila também serviu de modelo para a imagem da
Princesa Leia Organa, mas a opção artística tomada pelo realizador Gareth
Edwards, que preferiu manter o legado de Cushing em vez de simplesmente
escolher outro ator, após receber garantias que o processo seria credível,
mostra que longe vão os tempos em que foi uma dor de cabeça sobrepor as cabeças
de Brandon Lee e Oliver Reed no corpo de outros atores para completar os breves
instantes que faltavam de "O Corvo" (1994) e "Gladiador"
(2000), efeitos engenhosos que agora parecem toscos.
Já em 2004,
a opção controversa de manipular imagens de um jovem Laurence Olivier para
"interpretar" o vilão de "Sky Captain e o Mundo de Amanhã"
levantou uma questão ética que agora volta a surgir perante a evolução que se
testemunha em "Rogue One": mesmo com a autorização dos herdeiros ou
gestores dos legados — como aconteceu nos casos de Olivier e Cushing — tem
Hollywood direito a usar a imagem de atores que já morreram para voltarem à
vida em projetos que nunca saberemos se
aceitariam se fossem vivos? Não podemos deixar de pensar que tudo
isto pesou na decisão de Robin Williams de criar disposições no seu testamento
que impedem a utilização da sua imagem até 2039, mas sabe-se que outras
estrelas já fizeram digitalizações completas para serem usadas pelas
tecnologias do futuro, garantindo assim outra fonte de sustento aos seus
descendentes.
Qualquer que
seja a resposta à questão, Hollywood aproxima-se a passos largos da ficção
científica de "O Congresso".
Nesse filme
realizado por Ari Folman em 2013, a atriz Robin Wright — interpretada pela
própria — aceitava a proposta de um estúdio importante para vender a sua
identidade cinematográfica: em troca de uma avultada quantia, ela era
digitalizada e os seus clones digitais, sempre jovens, poderiam ser usados sem
restrições em qualquer filme de Hollywood, mesmo os mais comerciais que
recusara fazer no passado...
Grande parte
deste texto foi extraída de um post do jornalista Nuno Antunes para o website http://mag.sapo.pt/cinema
Fotomontagens:
SWCP
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